debruçada sobre o mar

debruçada sobre o mar

terça-feira, 17 de novembro de 2009

FACE PERDIDA

Depois de tudo o que se tem passado esta é operação que este regime republicano pretensamente democrático e decadente, tem que fazer. Assumir que perdeu a face.

Cirurgia estética recomenda-se.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Luanda Angola Portugal,


Hoje faz anos que pelas cinco e tal da tarde, eu, a minha mãe e as minhas irmãs nos deslocamos ao Palácio de Sua Exª o Sr. Governador Geral para vermos uma última vez a bandeira nacional encarnada e verde com as quinas hasteada no mastro principal da Província.

Estava um fim de tarde típico de Luanda. Com aquela iluminação dourada e uma brisa suave.

Fomos para um último acto de sentimento de pertença patriótica.

Mas ironicamente a bandeira já tinha sido retirada (vim a saber muitos anos mais tarde por volta das duas, para evitar confusão…qual? Num país que estava em guerra). Ironia porque aquele dia era a véspera da “independência”. Ironia porque aquela data não significava nada. Era nada. Ser nessa noite ou noutra qualquer era indiferente. O País estava esventrado a Província incendiada e o povo estilhaçado. Podem chamar-lhe independência. Podem mesmo chamar-lhe o que quiserem. Nunca será nada do que lhe quiserem nomear, se não lhe chamarem …morte.

Lembro-me e ainda oiço o silêncio triste que se fez depois da decepção em todo o regresso a casa.

(Também me lembro da última vez que ouvi o hino nacional, dias antes e de ter chorado. Da minha mãe me ter falado da possibilidade de uma vez eu crescido poder vir à Metrópole matar saudades de Portugal.)

Luanda Angola Portugal, continua e continuará a ser o meu local de nascimento e o meu endereço emocional.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Uma noite escura sem fim

Faz anos de uma noite negra, muito escura de que ainda não se verá o aproximar da aurora.
Faz anos que de rádio no ouvido acompanhei a proclamação da independência de Angola.
E quanto a isto há muita coisa para se escrever.

1 Não foi independência e muito menos de Angola. Foi uma proclamação patética de supostas boas intenções para um eventual país. Mas no momento em que isso aconteceu foi para um território chamado Luanda. E nem foi todo o distrito. O Kifangongo estava ocupado por forças opostas aos declarantes da tal suposta independência.
2 Não foi independência porque por força da guerra fria, aquele pedaço de terra a que os portugueses deram o nome de Angola, passou automaticamente das mãos Lusas para as soviéticas ainda que por entrepostas (cubanas) mãos.
3 Os independentistas não estavam de acordo entre si e até houve duas declarações simultâneas. Luanda e algures na mata, ao sul de Angola. E como era kandengue não me lembro se a FNLA também deu o ar da sua graça.
Foi um tempo histórico. O dia 10 foi calmo e com um clima de emoção nervosa. Honestamente acho que toda a gente estava à espera que desse porcaria da grande, com um ataque massivo dos fnela e um delírio mortal da população luandense, que entre bebedeira, medo e fúria contida desse para a estupidez. Falemos claro os poucos brancos parvos que ainda restavam, mesmo os ligados ao mpla estavam receosos.
Era uma expectativa total. E muito medo. Sim muito medo.

O dia foi interminável. A noite foi calma. Pela meia-noite a voz trémula e ridícula do camarada presidente dr. Agostinho Neto, primeiro presidente da Republica Popular de Angola (na altura havia muitas republicas populares e democráticas que à falta das ditas a tinham no mome) proclamou a independência de Angola (Luanda, que era a região que ele controlava).
Lembro-me bem. Estava deitado, bem como toda a família, cada um na sua cama, com a casa completamente esqura e com o meu transístor portátil, rádio, mesmo, como se chamava na altura. Chorei. Não sei porquê muito bem. Mas chorei e tive aquilo que anos mais tarde vim a perceber. Uma profunda angústia.

Não me lembro do dia da semana, mas foi feriado.

No dia seguinte, por ser feriado, tomamos um pequeno-almoço calmo em família. Os adultos estavam aliviados, não houve mortandade, nem ataque invasor na noite mais temida das nossas vidas. Lembro-me de comentar com a minha irmã mais velha que ele (Neto) tinha dito que haveria liberdade religiosa. Um pouco como exorcismo desse e outros medos. Mas o receio era grande.
Fomos à praia (pode parecer estupidez, mas a guerra torna as pessoas esquisitas). Fomos à ilha por ser mais perto da cidade e ficamos do lado de dentro da baia. Estava um dia cinzento medianamente quente e vazio. Sim isso mesmo, vazio. Da rua Lopes Lima até à ilha, como se calculará, não poderei dizer quantos carros e pessoas vi. Mas posso dizer que aquele trajecto nunca foi tão despovoado. Facto aliás que vinha acontecendo há alguns dias de forma crescente.
Lembro das conversas dos grandes serem ente a expectativa cautelosa, a pessimista e a leve esperança que num futura certamente longínquo fosse bom.
Mas foi aquilo que se viu.
Lembro-me terminando a declaração do raramente sóbrio camarada presidente Neto que proclamava um independência para todos os angolanos independentemente da sua raça, credo, sexo ou ideologia política, onde todos deveriam viver em liberdade.
Não sei se mentiu ou se não sabia o que era liberdade.
Ainda permaneci (quase) um ano nessa Angola independente, onde o medo da guerra se juntou ao medo de um regime arbitrário e desumano como são todos os regimes comunistas.
Talvez noutra ocasião me disponha a falar da guerra e do dia-a-dia nesse “libertado” pais.
Fica a nota que é importante: esse país (se o for) tem as fronteiras que têm e a sua consequente riqueza porque muitos portugueses anónimos morreram lutando para que assim fosse. Nenhum angolano lutou e deu a sua vida como esses bravos do fim do século XIX o fizeram. Esse cujos herdeiros foram prosseguidos, mortos e proibidos de viverem na terra que eles ajudaram a alargar.